quinta-feira, 26 de julho de 2012

A DITADURA DA FELICIDADE



Vinha pensando neste assunto esta semana e fiquei ainda mais interessada quando Pedro Bial anunciou o tema do seu programa (sempre o tive na conta de repórter inteligente, ainda que tenha visto como desvio seu enveredar pelos caminhos do Big Brother). A tal ditadura da felicidade parece de fato existir (um pequena olhada nas redes sociais, por exemplo, cria a ilusão de um mundo perfeito, de pessoas que têm apenas coisas boas a dizer) e me pergunto se ela não é necessária. A angustia, às vezes patológica, que as pessoas desenvolvem ao se verem obrigados a encarar suas tristezas me parece natural. A única questão é que momentos ruins fazem parte da vida e não dá para simplesmente fingir que não existem; muitas vezes representam um rito de passagem e precisam ser vividos em sua plenitude como se numa catarse.

Ditadura significa poder absoluto, despotismo. Qualquer coisa que passe pela tirania já tem motivo para ser rechaçada, portanto levar as pessoas a sufocarem suas tristezas para não as trazerem a público é inaceitável. É preciso ficar o tempo inteiro mostrando uma felicidade como se numa eterna propaganda de margarina? As emoções tidas como negativas também impulsionam o homem - sentir raiva e rebelar-se diante de injustiças já fez grandes revoluõçes.Tem que haver espaço sim para a vida de verdade, para as pessoas de carne e osso. Não bastasse a necessidade visceral de expor algumas feridas, o ser humano ainda é capaz de ter momentos profundamente inspirados quando estão entregues a suas melancolias.

E tem mais – é possível definir o que é felicidade? Como se pode ditar regra sobre algo tão impalpável e relativo? Cada um tem sua própria noção de felicidade e constrói a sua história a seu modo. Aqui não cabem fórmulas ou receitas prontas; é totalmente sem script. Ser feliz pode ser ebulição ou calmaria, euforia ou sossego, agitação ou ócio. Pode estar em realizações pessoais ou profissionais. Pode vir suavemente ou ser fruto de grandes batalhas. Eis o seu elo com a tristeza, como face de uma mesma moeda. Afinal quem poderá dizer reconhecer o paraíso se não faz idéia do que seja o contrário.

Se é para ditar ordens, vamos exercitar a tolerância. Se é para seguir um roteiro, vamos ser mais verdadeiros. No final vale a máxima “viva e deixe viver”... e seja feliz! 

quinta-feira, 19 de julho de 2012


Vinte e cinco anos de idade, mas olhar sincero e o sorriso ingênuo revelam uma criança. De longe fita com cuidado, se a empatia for verdadeira se aproxima, caso contrário repele com fervor desconcertante. Estaria aqui ou em um lugar distante, como que sonhando acordada? Será que enxerga mais do que os simples mortais? Definitivamente há algo de enigmático por trás daquela face por vezes inexpressiva, contudo a poucos é dada a possibilidade de desvendá-lo.


De repente o passado se insinua como se fosse um filme. É possível ver aquela pessoa ao nascer, sua mãe talvez não estivesse preparada, afinal com seu bebê ia ser tudo diferente. Muniu-se da única arma possível; o amor. E juntos percorreram um caminho de muitos obstáculos e desafios, mas também de um aprendizado incomparável. O mundo lhe dizia todo o tempo que aquela pessoa pela qual se desdobrava era diferente. Diferente de quem? Quem é a perfeição de referência? Em princípio até que comprou esta história, mas com o passar dos dias percebeu que sua criança tudo podia dependendo do estímulo que lhe era dado. Tinha seu próprio ritmo, é verdade, mas alcançava seus objetivos a seu modo. Daí em diante nada segurou a dupla. É óbvio que a trajetória vai muito além da dedicação financeira para bancar terapias específicas, muitas vezes tratamentos médicos, exige um comprometimento verdadeiro, mas pensando bem, qual o pai ou mãe não precisa desta intensidade? E foi encarando a situação com naturalidade que toda a família se envolveu na criação daquele membro tão valoroso quanto os outros. Aos que insistem em rotulá-los de diferentes, esta é mais uma família que comprova: pensando bem são diferentes mesmo – diferentes na capacidade de amar sem pedir nada em troca, diferentes na sinceridade em tudo que fazem, diferentes no impacto positivo que geram em seus lares.


Alguns se referem a esta condição como o cromossomo do amor, tamanho o sentimento que aflora de seus portadores e pessoas ao seu redor. A trissomia do cromossomo 21, também conhecida como Síndrome de Down, não escolhe credo, raça ou classe social. Com ela nascem vários níveis de comprometimento físico e mental, os quais com frequência requerem tratamentos específicos. O dia-a-dia da criança portadora é certamente trabalhoso, não muito distinto das outras. Não é fácil de ser encarada, porém é um desafio recompensado diuturnamente. E eles estão por aí crescendo, adolescentes e adultos que vivem como os demais, com dilemas e incertezas. Passados vinte e cinco anos, vê-se o quanto a sociedade mudou, o quanto as questões relacionadas à inclusão são discutidas e de fato se consegue ter uma vida plena nos dias de hoje. Por outro lado vê-se que ainda há muito o que melhorar e o principal está numa mudança genuína de comportamento. Aqueles que têm filhos não portadores da síndrome tem importância enorme nesta questão à medida que ensinam o respeito às diferenças e apoiam estas iniciativas. Ganha todo mundo, pois a convivência com estas crianças abre um mundo de possibilidades. As políticas públicas para o enfrentamento da questão também precisam ser exigidas. Quando de fato abrirem-se os corações e o acolhimento for natural o enigma estará desvendado.

domingo, 8 de julho de 2012

ENQUANTO VOCÊ CRESCIA



Sabe aquilo que todo mundo repete quando se tem filhos pequenos? “Pena que crescem tão rápido!” Ouço muito isto.  Para dizer a verdade o tempo inteiro, e de tanto ouvir, introspectei desde cedo que ia aproveitar cada minutinho com as minhas crias. Esta vem sendo a prioridade número 1; na corrida do trabalho, da vida cotidiana, das incursões artísticas, dos estudos ou do lazer, o foco é nelas. Ainda assim, numa pestanejada rápida abri os olhos e me dei conta do quanto elas cresceram.


Naquela fração de segundo pensei em algo para lhe falar. Precisava desesperadamente lhe contar o que andei fazendo enquanto você crescia. Durante esses anos tentei com afinco lhe mostrar o valor da verdadeira amizade. Esforcei-me para lhe fazer discernir entre o certo e o errado. Trouxe para você a companhia dos livros pensando em lhe abrir os horizontes, e com eles a importância dos estudos para conseguir de fato ser livre. Exercitamos o poder do afago e da gentileza. Constantemente borbulha no meu peito aquelas angústias –“será que estou fazendo certo?”, “será que o resultado vai ser bom?” Na verdade o que queria mesmo era ficar grudada em você o tempo inteiro, mas a razão me impele a lhe dar as ferramentas para um caminho de autonomia e autoconfiança. Queria lhe dizer que em todos os momentos, desde aquele primeiro instante em que trocamos um olhar, desejei sempre, como toda mãe, que você fosse muito feliz. Imaginei formas de fazer isso acontecer, como se estivesse em minhas mãos. Talvez hoje já me sinta bem insegura quanto a possibilidade de tomar as rédeas do seu futuro, mas nunca descerei desse vôo cego de ave-mãe semeando flores em seu caminho. Como se a felicidade fosse um destino de viagem, pus-me a arrumar suas malas. Coloquei nela vários nãos que lhe disse ao longo do tempo para que aprendesse a ter limites; muito sim também porque a vida tem que lhe sorrir; um tanto de fé em Deus para você ter certeza de que nada lhe faltará; retidão de caráter para seguir em frente com integridade; bons exemplos para ter sempre uma referência; respeito ao próximo para buscar viver em harmonia; e claro, enchi todos os cantinhos com o mais genuíno amor que lhe declaro todos os dias. Com isso, apesar de não garantir uma viagem sem turbulências, sei que vai ser capaz de enfrentar qualquer desafio, principalmente o de construir o que você queira chamar felicidade.


E por falar em felicidade, para a minha própria, constato que vi bem o tempo passar, acompanhando de perto cada progresso na vida destas que me são tão caras, fitando com toda força o reloginho da vida na vã esperança de fazê-lo andar mais devagar. Luta inglória, esta! Já que você tem que crescer, quero assistir, não de camarote, pois mãe que é mãe cai na pista.