Nenhum de
nós sabe que marca deixará no outro. E isso muitas vezes pode ser
surpreendente.
Ele era
um cara comum. Queria para sua vida todas as vitórias que a gente habitualmente
deseja. Tinha, como um cara comum, muitos defeitos e muitas qualidades, estas
últimas causando mais impacto do que os defeitos. Uma característica marcante,
e que talvez por isso ambígua, era ser orgulhoso (dependendo do ponto de vista,
ou por outra, da intensidade, isso pode navegar tranquilamente entre o positivo
e o negativo). Orgulhoso para não pedir ajuda a ninguém, para não admitir suas
fraquezas e para cortar-lhe a própria carne para afastar o dissonante, mas
também orgulhoso pelas vitórias dos que lhe eram caros, por lutar o bom combate
e por de certa forma ser um sobrevivente.
Lembro
bem de outra faceta – vivia o hoje intensamente. Dizia levar a vida na flauta
(demorei um tanto para entender o significado desta expressão). Com
isso protagonizou episódios hilários, como quando dirigiu mais de setecentos
quilômetros num só dia apenas para dar um mergulho na praia de Atalaia. Ou como
o dia em que chorou vendo na televisão passar Os Filhos de Gandhi, do outro lado da baía. E quando em pleno Terraço Itália chamou o maitre para
dizer que a comida estava quase
perfeita, mas estava faltando farinha.
Os
ouvidos eram bem alimentados; gostava Billy Holliday, Ella Fitzgerald, Sarah
Vaugan e Frank Sinatra. Sobrava espaço para Paulinho da Viola, Chico Buarque e
tantos outros que embalaram sua geração. Uma geração ligada em roupas de bom
corte e sapatos de couro legítimo, que sabia dar valor a um bom linho. Não por
acaso havia feito parte dos Dez Mais (
era como se denominava o grupo de rapazes bem vestidos que se encontrava na Rua
Chile nos saudosos anos 60).
E a
paixão pelo mar, incansável e inabalável, um dos grandes prazeres, trabalho e
lazer. Usava com frequência a expressão “tombo do mar” para descrever e
valorizar seu ganha-pão.
Dedicação
à família era uma característica imperiosa. Com todo apreço pela boemia e toda
a curiosidade com o mundo que o cercava, o convívio familiar consistia num
porto seguro e estava acima de todas as coisas. Essa convivência representou um
grande aprendizado mútuo e sobremaneira moldou a forma que seus filhos
conceituam família.
E amou,
amou demais e deixa essa sim a grande marca nos seus, a quem se dedicou a vida
inteira. Vem sempre à mente a canção de Sinatra – “amei, sorri, chorei , cometi
meus erros, tive minhas perdas e fiz isso do meu jeito”.