domingo, 29 de setembro de 2013

UMA INSPIRAÇÃO

Uma lembrança ficou na mente, presa com seus poderosos tentáculos, e uma das melhores coisas que lhe aconteceu. A vida até aquele momento tinha sido tão vazia, tão desprovida de emoção e repentinamente a pasmaceira se transformou. Pensando bem, as coisas apenas começaram a mudar quando Hanna se permitiu sonhar e enxergar que muito dessa emoção que tanto desejava é construída por cada um. Viver uma vida com pena de si própria, lamentando cada suspiro não era mesmo um caminho saudável, mas buscar energia para isso sempre foi difícil.

A manhã de sábado parecia normalmente entediante. Acordou tarde, demorou a sair da cama, e na verdade só o fez por conta do interfone. Um certo pacote foi deixado na portaria e a curiosidade a fez correr rapidamente os andares do prédio e correr para abrí-lo. Quem não se animaria com uma bela novidade para dar movimento à sua rotina tão estagnada?  Rasgou a embalagem com tanta pressa sem nem perceber que havia algo escrito nela. Descobriu um livro lindo da capa azul e embarcou em sua viagem.

Conheceu a história de uma adolescente que tratava um tipo raro de câncer. Surpreendeu-se com as inúmeras possibilidades que surgiram à frente daquela criatura de vida aparentemente tão finita. Não pôde deixar de pensar em si mesma, em gozar de boa saúde e ainda assim não dar valor a isso. Passava tanto tempo sentindo-se um nada que não conseguia enxergar as coisas de valor que estavam à sua volta. Tantas vezes sentiu-se pequena diante de tudo, tantas vezes desistiu sem nem mesmo ter tentado, tantas lágrimas derramou por coisas pequenas, tantas vezes se intimidou por obstáculos que jamais pensou em transpor. Se aquela menina, limitada por um torpedo de oxigênio, viveu seu pedaço de vida de maneira tão plena, amou e foi amada, do que não seria ela própria capaz? Em algumas horas leu o volume inteiro, aquele tipo de literatura que gruda igual a chiclete, e tomou coragem para retomar vários planos engavetados. Aquilo tinha sido tão tremendamente inspirador que chacoalhou de verdade suas emoções. A poesia dessa transformação é ainda maior; poucos dias depois a embalagem amassada do tal livro ainda estava no cesto de papéis, e algo escrito desta vez chamou atenção. O pacote era endereçado a vizinha da frente. Reembalou o livro, desculpou-se pelo ocorrido e entregou-o à verdadeira dona para seguir sua jornada de encantamento sobre alguns. Voltou a dançar, demitiu-se finalmente daquele emprego que lhe sufocava, retomou velhas amizades e se abriu a um novo amor. Era o impulso que nem percebera faltava.  Apenas um toque, uma constatação de que tudo de fato “vale a pena se alma não é pequena”, um olhar mais generoso, a consciência de uma força interior que sempre está lá basta manter a posse dela.

É possível encontrar essa inspiração onde menos se espera. É preciso estar atento e se permitir. Ninguém anda por aí dizendo que a vida é fácil, que tudo nela é suavemente palatável. Muitas vezes ela nos tomba tão intensamente que levantar parece impossível, mas somos capazes de seguir levantando sempre, e depois de cada tropeço o couro vai ficando mais curtido, e se resiste mais, ergue-se mais rapidamente e o melhor de tudo, aprende-se a evitar muitos dos tombos.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

UM LUGAR PARA AS FRUSTRAÇÕES



Frustração é definida como emoção que surge quando não se alcança algo almejado, do que se pode concluir que a vida é cheia de frustrações, pequenas ou grandes, pesarosas ou insignificantes, mas invariavelmente presentes. De fato não é sempre que se alcança um objetivo, e a maneira de lidar com isso é que difere as pessoas; sofrer mais ou sofrer menos é questão de ponto de vista, onde entra a resiliência ou flexibilidade, capacidade adaptativa para mudar o caminho, encontrar um lugar para as frustrações.


“Alguns infinitos são maiores que outros”.  E como Hazel Grace, personagem de A culpa é das estrelas, se aproxima do Poetinha – “que seja infinito enquanto dure”. Falam ambos do quanto é valioso viver cada momento intensamente, dar importância às coisas certas, banhar-se de um ânimo sempre renovado e assim dar uma chance para a felicidade. Muita coisa colocada no saco das frustrações é na verdade um olhar equivocado. Se o casamento durou 15 anos, vocês tiveram filhos lindos, contruíram muita coisa juntos e depois cada um tomou seu rumo não há porque dizer que não deu certo. Se não conseguiu entrar no curso que tanto sonhou e usou toda sua energia com um novo plano de vida que está sendo bem sucedido também não há porque dizer que fracassou. Canalizar as potenciais frustrações de maneira produtiva é a única forma de não ser marcado por elas. O contrário acontece quando se encara os obstáculos de forma negativa, tudo isso é descarregado no que não traz um passo adiante (como na comida, na bebida, em qualquer vício, ou até mesmo em culpar as pessoas que te cercam).

Quem sequer insinuou que exercitar esta capacidade de transformar é fácil? Algumas frustrações são como uma rasteira da vida após a qual levantar é um esforço sobre-humano; são paralisantes. É preciso determinação para sacudir a poeira e reerguer-se numa nova ordem. E viver é muito disto, é ter coragem pra mudar, transigir e se libertar das coisas ruins que muitas vezes nos tornam reféns, principalmente dentro de nosso próprio inconsciente. Ter bom humor é fundamental, rir de si mesmo, caminhar com leveza e saber que há muita coisa demasiado pequena para permitir lhe entristecer. E sabe de uma, um bom lugar para as frustrações não é um esconderijo; é onde ela possa ser encarada de frente e destituída de sua pretensa força.