domingo, 19 de fevereiro de 2012

O ENCANTO DA PEQUENA SEREIA

CONTO N°3

A menina se fantasiava de Pequena Sereia há uns três carnavais. A mãe assentia intrigada; como uma personagem de contos de fadas podia exercer tamanho fascínio sobre aquela criança? Desta vez, a fantasia veio mais rebuscada – influenciou-se pelas histórias de capa e espada e criou uma pequena sereia mosqueteira; incrementou-a com máscara e espada, para conforto da mãe que elogiou a criatividade.

O imaginário infantil é algo encantador. Nesta época da vida é possível fazer viagens infindáveis a lugares fantásticos. Aos olhos dos adultos trata-se apenas de mais uma excentricidade de menina, contudo para ela é uma extensão do mundo real. O mundo da imaginação se entrelaça com a realidade e ela de fato sente-se uma mosqueteira desbravando os sete mares. Não se sabe ao certo de adormeceu; fato é que repentinamente singrava o fundo das águas em seu cavalo marinho quase alado.

Para o povo dos Mares Luminosos era época de festa e todos da redondeza se preparavam para o grande baile real. Todos exceto os moradores da zona abissal. Suas crianças, apesar da pouca idade, sofriam efeitos das guerras travadas pelos adultos. Eram impedidas de sair das imediações da Cidade Sombria, achavam que nada além daquilo existia até ouvirem falar do tal baile. Nas conversas que ouviam dos mais velhos a festa parecia ser um momento especial, mas era com desprezo no olhar que findavam suas colocações. Perguntando a uma anciã souberam que houve um tempo em que os dois povos viviam em harmonia e tinham tal baile como a coroação da união entre eles. O último baile deste tempo de paz tinha sido o de noivado da Princesa Luz, filha do rei dos Mares Luminosos, com o Príncipe Noir, herdeiro das terras sombrias. Durante as festividades houve um apagão repentino e ao se darem conta os dois jovens haviam sumido. Culparam um ao outro pois num passado distante dois herdeiros daqueles reinos foram sequestrados pelos ancestrais do rei dos Mares Luminosos para impedir que suas terras fossem divididas.

A curiosidade das crianças da Cidade Sombria as levou longe das suas terras; repentinamente se viram numa imensidão de corais luminosos onde uma bela sereiazinha mosqueteira treinava esgrima. Ficaram impressionados com sua destreza e coragem. Ela, apesar de destemida, jamais ousara desobedecer as ordens do rei, por isso não entendeu bem de onde viam aquelas crianças com lanternas em seus capacetes. Por fim aproximaram-se e descobriram todas as coisas que tinham em comum e que um dia fizeram a união de seus povos. Os meninos da Cidade Sombria contaram o que ouviram da anciã, de como haviam sido tempos felizes de paz e prosperidade. Agora ela entendia porque seu governante era tão recluso e vinha tentando acabar com as festividades. A rainha o impedia por saber que seu povo precisa manter a alegria em seus corações. Todos se empenharam muito nas buscas pela sua amada princesa, mas o trabalho fora em vão. E a pequena sereia agora prometia a si mesma que tudo voltaria a ser como antes.

Os preparativos para o baile deixavam os adultos suficientemente ocupados a ponto de não perceberem a ausência da pequena sereia que conseguiu entrar no antigo quarto da Princesa Luz, que era mantido quase como um santuário. Esbarrou-se num quadro na parede de trás de onde caiu um envelope. Era uma carta do Príncipe Noir. Nela ele dizia para a princesa o quanto a amava e que ambos precisavam proteger esse amor da cobiça de seus pais. Decidira por fugir e o momento certo seria o Grande Baile Real. Naquela noite eles agiriam como se nada estivesse acontecendo e no momento da dança trataria de produzir um apagão para que saíssem sem ser notados. Pelo visto assim o fizeram, e a pequena sereia seguiu em seu plano de encontra-los. Talvez os dois não soubessem da infinita tristeza em que seus pais mergulharam após seu desaparecimento, marcando de forma decisiva a vida de seus povos.

A única pista do paradeiro dos dois jovens era um desenho de um grande navio. A pequena sereia olhou-o com atenção e lembrou-se de já tê-lo visto em algum lugar. É claro! Numa de suas escapadas pelos oceanos vira um navio como aquele próximo à costa. Voltar lá era perigoso pela proximidade com os seres da terra. Será que os príncipes cometeriam a estupidez de chegar tão perto da praia?

O caminho até o navio abandonado era longo e guardava muitos obstáculos para quem decidisse se aproximar. A pequena sereia mosqueteira contou com a ajuda de seus novos amigos da Cidade Sombria que podiam guia-la por mares mais profundos com suas lanternas, mantendo-se assim fora do alcance do povo da terra. Todos ficaram surpresos ao ver que o navio se transformara num lindo refúgio para a Princesa Luz e para o Príncipe Noir. Através das escotilhas viram os dois sorridentes brindando num belo jantar. Tiveram tempo de ouvir a princesa dizer com tristeza no olhar que apesar da felicidade de estarem juntos sentia muita falta de seu povo e imaginava como as coisas estavam por lá. A pequena sereia mosqueteira e as crianças da Cidade Sombria sentiram que era hora de entrar em cena e contaram aos príncipes tudo que se passara desde então. Apesar da grande hesitação por parte do príncipe, a princesa Luz o convenceu de que era preciso voltar.

Chegaram ao Reino dos Mares Luminosos no momento em que acontecia o baile. Como não tinham permissão de entrar, a pequena sereia mosqueteira precisou por sua habilidade com a esgrima em ação e lutar com os guardas. Enquanto isso as crianças voltavam à Cidade Sombria com a missão de convencer o rei a ir no baile. Parecia que haviam cronometrado – chegaram todos ao mesmo tempo no salão principal. Os reis não conseguiram conter as lágrimas. Em outros tempos teriam banido os filhos para sempre, mas depois de tanto sofrimento já estavam arrependidos de todo o orgulho e ganância que os tinha guiado até ali. Deram-se aquele abraço por tanto tempo guardado e o baile se transformou novamente numa grande celebração entre os povos. E nossa pequena sereia descobriu o encanto que há por trás de todo grande amor.

E a menina com a fantasia da Pequena Sereia despertou em pleno baile de carnaval. E quando a mãe perguntou se estava gostando ela respondeu com um grande sorriso que não deixava dúvidas.

Inspirada na minha pequena sereia Catarina (há três carnavais).

3 comentários:

  1. Amiga, seu blog é incrível! Que texto lindo! Parabéns pela imaginação e criatividade, acho que Cati herdará esses dons de vc... Um grande bjo e mais uma vez, Parabéns! Saudade, Ursulinha!

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  2. Estou acompanhando seu blog rotineitramente e como sempre haja criatividade, acho que Kate puxou a tu, rs, bjs Gaby da MN

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